Soja invade áreas protegidas e comunidades silenciam em Rondônia
Imagem: reprodução internet

Soja invade áreas protegidas e comunidades silenciam em Rondônia

Mapas recentes apontam avanço da fronteira agrícola sobre reservas e unidades de conservação enquanto autoridades permanecem inertes

No sul de Rondônia, a paisagem mudou de forma acelerada. Onde antes se via floresta fechada, igarapés preservados e roçados familiares, hoje o que predomina são campos extensos de soja, marcados pelo verde uniforme das lavouras. Estudos recentes de cartografia ambiental revelam que a fronteira agrícola avança para dentro de territórios que, em tese, deveriam estar resguardados pela legislação. São áreas indígenas, quilombolas e unidades de conservação que aparecem nos mapas agora entrecortadas por talhões cultivados. O que acontece é uma transformação silenciosa, pouco discutida publicamente e com forte impacto sobre a vida de quem depende da terra e da floresta para sobreviver.

A análise indica que, nos últimos anos, a expansão da soja não se limitou às áreas de produção tradicional, como Vilhena e Cerejeiras, mas ultrapassou limites e se instalou nas bordas de terras indígenas e parques estaduais. Em comunidades ribeirinhas e aldeias, moradores relatam que caçadas ficaram mais difíceis, que os peixes rarearam e que antigas trilhas de coleta desapareceram sob a pressão das plantações. Esse avanço não ocorre apenas no espaço físico, mas também no cotidiano das famílias que veem ameaçadas suas formas de sustento e sua identidade cultural.

Na parte legal, há um vazio de atuação visível. Até agora, não se registram ações efetivas do governo estadual que confrontem esse crescimento irregular. Órgãos de fiscalização ambientais atuam em operações pontuais, mas sem constância. Os tribunais ainda não consolidaram decisões que imponham limites claros, e os processos que tramitam seguem em ritmo lento, distantes da velocidade com que o trator abre clareiras e a lavoura se instala. Esse descompasso entre a lei e o campo abre espaço para que a soja avance sem resistência significativa.

A ausência de reação oficial se reflete no silêncio público. Enquanto comunidades pedem ajuda, faltam respostas concretas da esfera política. A grande maioria dos políticos quase não discutem o tema, e a pauta ambiental aparece de forma periférica nos discursos institucionais. Esse vazio de debate cria a impressão de que o assunto é menor, quando na prática envolve direitos constitucionais de povos originários, compromissos internacionais assumidos pelo Brasil e a própria sustentabilidade da região.

O impacto ambiental também é evidente. A substituição da floresta por lavoura provoca desequilíbrio no regime hídrico, altera microclimas e facilita a ocorrência de queimadas. Com menos cobertura vegetal, rios e igarapés assoreiam, comprometendo o abastecimento de água e a pesca. A biodiversidade perde espaço, e espécies tradicionais desaparecem de territórios antes abundantes. Esses danos não ficam restritos a quem vive diretamente nas áreas invadidas: atingem o conjunto da população, que depende da floresta em pé para o equilíbrio climático e para a manutenção de serviços ambientais básicos.

Mesmo diante desse quadro, a resistência existe. Associações comunitárias e lideranças indígenas têm buscado apoio em organizações de defesa socioambiental, além de recorrer a ações judiciais para tentar frear o avanço. No entanto, essas iniciativas enfrentam limitações financeiras e jurídicas, o que torna o enfrentamento desigual. De um lado, grandes grupos econômicos com capacidade de investimento e articulação política; do outro, comunidades que recorrem a instrumentos legais, mas encontram barreiras na própria estrutura do sistema de justiça.

A situação em Rondônia mostra que a expansão agrícola precisa ser discutida com mais transparência. O agronegócio é parte importante da economia local e nacional, mas sua expansão sem limites legais ameaça a integridade de territórios que não deveriam estar em disputa. O que está em jogo não é apenas a preservação de áreas verdes, mas a proteção de modos de vida que se mantêm há gerações e a garantia de um futuro sustentável para o estado.

A pergunta que se coloca é se as instituições públicas conseguirão reagir a tempo de conter esse processo. Caso contrário, reservas e comunidades tradicionais podem perder não só espaço físico, mas também a chance de manter vivas culturas e práticas que fazem parte da identidade amazônica. Em meio ao silêncio das autoridades e à pressão das máquinas no campo, o futuro da floresta em Rondônia se decide em cada hectare derrubado ou preservado.

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