Quinze deputados e senadores, especialmente de esquerda, apresentaram emendas que foram redigidas pela Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag) para alterar medida provisória de combate a fraudes no INSS. Historicamente ligada ao PT, a entidade é investigada pela Polícia Federal (PF) em razão do escândalo dos descontos indevidos, que gerou fraude estimada em R$ 6,3 bilhões, revelada pelo Metrópoles.
Os textos têm a assinatura de deputados e senadores. No entanto, a coluna analisou os metadados desses documentos e descobriu que a entidade aparece como a verdadeira autora das propostas. De um total de 578 emendas, 96 têm o nome da Contag ou de advogada da confederação como autor.
- Deputado Rubens Pereira Júnior (PT-MA);
- Deputada federal Jandira Feghali (PSol-RJ);
- Ex-senador Paulo Rocha (PT-PA);
- Ex-senador Jean Paul Prates (PT-RN);
- Senador Humberto Costa (PT-PE).
Publicada no primeiro ano do governo Bolsonaro, a Medida Provisória nº 871/2019 visava combater fraudes e irregularidades na concessão de benefícios do INSS. Entre as alterações previstas no texto principal, estava a revalidação anual dos descontos associativos. A partir do lobby das entidades, especialmente da Contag, o Congresso conseguiu adiar essa exigência para ser feita a cada três anos. No entanto, a medida nunca foi colocada em prática, uma vez que outra MP publicada em 2022 revogou definitivamente qualquer tipo de revalidação de assinaturas.
Entre os 15 parlamentares que apresentaram emendas da Contag, nove são do PT. São eles:
- Deputados: Zé Neto (BA), Patrus Ananias (MG), Valmir Assunção (BA), Marcon (RS), Rubens Pereira Júnior (MA);
- Senadores: Humberto Costa (PE), Jaques Wagner (BA);
- Ex-congressistas: Jean Paul Prates (RN), Paulo Rocha (PA);
A lista inclui também:
Deputados federais: Jandira Feghali (PSol-RJ), Otto Alencar Filho (PSD-BA), Daniel Almeida (PCdoB-BA)
Ex-deputados: Celso Maldaner (MDB-SC), Tereza Nelma (PSD-AL) — atualmente no governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT)
E um parlamentar do PL, partido de Jair Bolsonaro: o deputado federal João Carlos Bacelar. Procurado, ele negou relação com a Contag e não soube explicar a origem da emenda. (Veja a resposta de todos os parlamentares ao fim desta reportagem).
Lobby da Contag derrubou revalidação anual de descontos associativos
Algumas emendas redigidas pela Contag eram idênticas umas às outras, e tinham temas comuns que se repetiam. Doze delas, por exemplo, traziam a mudança em um artigo substancial para a Contag: passar de um para cinco anos o prazo de exigência para revalidação dos filiados aos sindicatos rurais e associações.
A ideia inicial do governo era que essa revalidação periódica limpasse as fraudes passadas e coibisse novos abusos.
Metadados mostram digital da Contag em emenda apresentada pelo senador Humberto Costa (PT-PE)
…pela deputada federal Jandira Feghali (PSOL-RJ)
…pelo deputado federal Rubens Pereira Júnior (PT-MA)
…pela ex-deputada federal Tereza Nelma (PSD-AL)
…pelo deputado federal Daniel Almeida (PCdoB-BA)
De acordo com as emendas redigidas pela Contag, porém, fazer a renovação anual seria “praticamente inviável” para essas entidades:
“Inobstante ser clara a diretriz da não interferência estatal no escopo organizativo das entidades associativas sem fins lucrativos, resta conhecida a necessidade de parametrizar os descontos das mensalidades associativas via INSS, visando com isso resguardar o ente público, não sem antes mensurar a inviabilidade operacional de revalidação anual das autorizações que os associados fornecem para o desconto da mensalidade social de seus benefícios previdenciários, haja vista a movimentação diária de autorizações feitas por todas as entidades que mantém Acordo de Cooperação com o INSS.”
“Assim, revalidar cada autorização anualmente torna o desconto da mensalidade social praticamente inviável”, prossegue o documento.
Por fim, a lei foi aprovada e estabeleceu o prazo de renovação a cada três anos, algo que jamais foi cumprido. Isso porque em 2022, uma nova Medida Provisória pôs fim a essa exigência de revalidação.
O que dizem os parlamentares que apresentaram emendas redigidas pela Contag
Todos os 15 parlamentares foram procurados. Apenas seis responderam.
Humberto Costa (PT-CE): Disse que apresentou emendas como líder da bancada do PT. Foi autor de três proposições elaboradas pela Contag.
Jean Paul Prates (PT-RN): Disse que as emendas foram parte de uma resposta da bancada do PT a “categorias, sindicatos e confederações de trabalhadores ligados ao partido”. Foi autor de 11 proposições da Contag. Argumentou que a MP criava dificuldades para beneficiários e que os textos buscavam proteger sindicatos honestos.
Zé Neto (PT-BA): Informou que as emendas eram para proteger sindicatos e associações rurais. Afirmou que nenhuma foi votada e que não havia qualquer relação com fraudes. Também afirmou que foram propostas coletivas da bancada. Foi autor de 11 emendas com metadados da Contag.
Jandira Feghali (PSOL-RJ): Disse que recebeu as emendas da Contag como recebe outras demandas, e que avaliou e considerou justas. Negou que tenha prática de aceitar proposições externas sem análise. Foi autora de três textos redigidos pela Contag.
João Carlos Bacelar (PL-BA): Negou relação com a Contag e não soube explicar a origem da emenda. Apresentou duas emendas com metadados da entidade.
Jaques Wagner (PT-BA): Disse que se opôs “firmemente à MP 871/2019” e que atuou contra a retirada de direitos. Negou ter trabalhado para relaxar o combate às fraudes.
Parlamentares que não responderam ou não retornaram:
- Celso Maldaner (MDB-SC);
- Daniel Almeida (PCdoB-BA);
- Marcon (PT-RS);
- Otto Alencar Filho (PSD-BA);
- Patrus Ananias (PT-MG);
- Paulo Rocha (PT-PA);
- Rubens Pereira Júnior (PT-MA);
- Tereza Nelm a (PSD-AL);
- Valmir Assunção (PT-BA).
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